20.9.11

. Fila.

Ao final do expediente, ela chega à agência do banco lotada.
Decide não se contaminar pelo clima de chateação e sorri.
Graceja com o garotinho entediado à sua frente.
Ajuda uma senhora com dificuldades no caixa eletrônico.
Guarda o lugar para um sujeito apressado que mal lhe pronunciou três palavras.
Entrega uma balinha de menta ao caixa e agradece sinceramente pelo atendimento prestado - ainda que este tenha demorado 57 minutos para acontecer.

Ela era esse tipo de pessoa incrível. Uma pena - de verdade- é que o fosse apenas em sua imaginação.

. We don't need another hero.

Sofria de covardia crônica. Um mal severo que o acometia desde a infância. Nunca rebateu um insulto, não revidava os tapas dos colegas e não lutava pelas figurinhas roubadas. Chegou a passar três horas de castigo por um delito que não cometeu, sem abrir a boca. Sua maior expressão de indignação foi arrumar as malas e fugir - para a sala!

Cresceu e os sintomas junto com ele. Fingia não ouvir as gozações na escola. Tornou-se um aluno dedicado porque não tinha coragem de tirar notas baixas. Não queria decepcionar os professores nem os pais. Descobriu os livros e passou a viver através deles. Era ele o personagem de cada história fantástica que lia, aventuras que jamais teria coragem de experimentar.
Não avançava a velocidade máxima permitida, não saía com os raros amigos e não era bom com as garotas. Sob a desculpa de compromissos inventados e prioridades fajutas, passava seus dias em solitária contemplação.

Você poderia argumentar que estou sendo dura demais em minha descrição. Que o pobre rapaz é dotado de paciência, serenidade e bons modos. Não se engane. Era um ressentido. Revidava cada um dos insultos com impropérios impronunciáveis em sua cabeça. Desenvolvia incríveis diálogos imaginados nos quais respondia com precisão cronológica as acusações sofridas. Resmungava secretamente e se imaginava tomando atitudes radicais, sendo ele a colocar os pontos finais. Seguia numa meia-vida. A máscara de passividade era um eficiente disfarce para esconder sua desesperada necessidade: coragem.